Tatuagem: sensível e pungente

Faz algum tempo que vem se estabelecendo um mito de que o cinema argentino seria de melhor qualidade que o cinema brasileiro. Verdade ou não, o fato é que a filmografia brasileira vem se mostrado não apenas de qualidade, mas, talvez por sua extensão territorial, extremamente diversificada. Temos produções com diferentes tons, gêneros e temas. Das comédias rasas com estética estabelecida pela TV aberta aos dramas profundos e experimentais. E há cinema sendo produzido em todo canto do país. Dito isto, é interessante notar que Recife produziu em 2013 dois dos melhores (se não os melhores) filmes nacionais do ano. Depois do ácido O Som ao Redor, a capital pernambucana presenteia o cinema brasileiro com Tatuagem, uma obra corajosa, divertida e pungente.

tatuagem-3

Escrito e dirigido por Hilton Lacerda, a trama acompanha Clécio Wanderley, líder da trupe de artistas conhecida como Chão de Estrelas que, juntamente com intelectuais e seu tradicional público de homossexuais, ensaiam, no final da década de 70, resistência política a partir do deboche e da anarquia. A vida de Clécio muda ao conhecer Fininha, apelido do soldado Arlindo Araújo, um garoto do interior que presta serviço militar na capital. É esse encontro que estabelece a transformação do universo desses dois personagens.

É notório que Irandhir Santos vem se tornando um dos atores mais completos do cinema nacional. O pernambucano despontou em Tropa de Elite 2, como o professor militante de direitos humanos Diogo Fraga, mas já havia feito uma ponta no excelente “Cinema, Aspirinas e Urubus“. A construção do artista Clécio é simplesmente impactante. Irandhir consegue atraves de gestos e olhares transmitir a leveza e segurança que o protagonista, como líder do grupo, pede. E o roteiro ainda acrescenta profundidade ao personagem nos apresentando a relação de Clécio com seu filho pré-adolescente. Mas a grande surpresa do elenco é Rodrigo Garcia e sua persona Paulete. Ainda que a trama gire em torno de Clécio e Fininha, sempre que Paulete surge em cena, Rodrigo rouba a cena. Seja como alívio cômico ou em cenas mais dramáticas, Rodrigo consegue oscilar entre uma atuação mais crua e outra mais teatral que casa perfeitamente com a personalidade do personagem.

A fotografia de Ivo Lopes Araújo é um espetáculo à parte. Abusando habilmente de sombras e tons quentes, Ivo confere um clima, ao mesmo tempo, mambembe e sententista ao longa que aumenta ainda mais a imersão do espectador na narrativa. E é impossível não aplaudir o uso dos enquadramentos e dos movimentos de câmera, como quando Fininha, após uma importante cena de amor, sai das sombras para banhar-se na luz, quase que num processo de purificação. E o que dizer das cenas em que Clécio está cantando no palco e a câmera passeia pelo ambiente num suave bailar como se nós, espectadores, estivéssemos dançando ao som da música ou do traveling na abertura do filme em que a objetiva circula quase que escondida pelos bastidores da casa de show?

Como dito anteriormente, Tatuagem figura, ao lado de O Som ao Redor, como um dos melhores filmes produzidos em solo brasileiro no último ano. Com atuações comoventes, uma direção impecável, além de um roteiro sensível e corajoso, Tatuagem é uma obra tão marcante quanto o título sugere. Aliás, uma correção: Tatuagem e O Som ao Redor não estão apenas entre os melhores filmes nacionais de 2013. Estão entre os melhores filmes de 2013 e ponto.

Leigômetro: ★★★★☆ 

Ficha Técnica
Tatuagem (2013)
Direção: Hilton Lacerda
Roteiro: Hilton Lacerda
Elenco: Irandhir Santos, Jesuíta Barbosa, Rodrigo García, Sílvio Restiffe, Sylvia Prado, Ariclenes Barroso.

A Menina que Roubava Livros

Drama ambientado na Alemanha nazista, A Menina que Roubava Livros pode ser definido como uma grande crônica sobre uma garota tentando sobreviver nesse ambiente hostil. A repressão, sua paixão pela leitura e o amparo a um judeu são apenas algumas das faces tratadas aqui. Continuar lendo

Azul é a Cor Mais Quente – delicadamente obrigatório

É uma pena que o novo longa do cineasta tunisiano Abdellatif Kechiche tenha causado tanta repercussão em função do teor sexual de algumas cenas. Isso acabou gerando uma visão reducionista da película. Adaptação da HQ homônima de Julie Maroh, Azul é a Cor Mais Quente é muito mais que um filme sobre sexo. É um retrato delicado sobre amadurecimento, descoberta e auto-conhecimento. Continuar lendo

Rush: No Limite da Emoção

Muito embora Niki Lauda seja tão importante neste filme quanto James Hunt, é o rosto de Chris Hemsworth que costuma aparecer em destaque nos pôsteres da divulgação. É desde aí que a personalidade dos dois vêm à tona. Hunt é considerado o último dos pilotos românticos e sua fama e seu ego sempre o precedem. Lauda, enquanto isso, é um cérebro analítico, que não costuma aparecer, a não ser que seja absolutamente necessário. Mas quando aparece, rouba a cena. Continuar lendo

Amor

Um casal de idosos, Georges e Anne, leva uma vida tranquila, até que um dia a esposa sofre um derrame. As dificuldades que eles passam fazem com que encarem grandes mudanças na rotina e reafirmem o seu amor. Continuar lendo