A Origem: uma idéia quase perfeita

Christopher Nolan é um cineasta com uma filmografia invejável. É dele o  impecável Amnésia, o perturbador Insônia, o belo O Grande Truque e, como se não bastasse, ele ressuscitou de forma magistral o Homem-Morcego com os excelentes Batman Begins e o Batman – O Cavaleiro das Trevas. Em A Origem, o cineasta mais uma vez acerta a mão e apresenta uma idéia genial com conceitos mirabolantes que, por pouco, não resultaram num longa perfeito.

A trama (evitando spoiler) é basicamente a mesma apresentada em qualquer filme do gênero “assaltos mirabolantes”. O pulo do gato está no ambiente onde o crime é realizado: saem os bancos/cassinos e entra o misterioso mundo da mente humana. Os personagens realizam “roubos” de informações de suas vítimas invadindo seus sonhos. Escrito inteligentemente pelo próprio Nolan, a história mostra Cobb (DiCaprio), o mais habilidoso ladrão de informações da mente, em seu último e mais difícil trabalho: ao invés de extrair, Cobb e sua equipe precisam inserir uma informação (na verdade, uma idéia) na mente de um importante empresário.

A Origem é uma bela mistura de Matrix e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças com pitadas de Onze Homens e Um Segredo e Vanilla Sky. Apesar das inúmeras referências, o cineasta acrescenta conceitos geniais relacionados a sonhos e subconsciente ao roteiro que dão um caráter único à sua obra. Não só os conceitos, mas a representação visual escolhida pelo diretor para ilustrá-los impressionam e caracterizam de maneira positiva o longa. Importante ressaltar que os efeitos visuais/especiais são um belo exemplo de tecnologia a serviço a narrativa: sem exageros e ao mesmo tempo fantásticos. No entanto, por se tratar de uma ficção científica, algumas inconsistências (científicas) acabam incomodando um pouco (destaque para a cena do elevador).

Como em todo longa envolvendo golpes super elaborados, o plano vai sendo apresentado aos poucos com os personagens explicando como funciona a tecnologia (e o próprio mundo) dos sonhos. É nesse quesito que reside a maior força da obra, onde até as cenas de ação hollywoodianas (dos tiroteios às cenas de perseguição) tem uma explicação onírico-científica plausível.

Infelizmente, o filme não é perfeito. Um dos problemas da película está em não se passar apenas nos sonhos. Explico. Enquanto as idéias apresentadas no nível dos sonhos são sempre inteligentes e instigantes, as motivações de toda a trama que se passam no “mundo real” acabam soando subjetivas e até superficiais. Além disso, uma sequência passada na neve – talvez por sua edição, não complexa, mas um tanto confusa – acaba destoando do restante da projeção. Sem falar da solução (não o final do filme) que se apresenta de maneira abrupta dando a idéia de que faltou alguma coisa.

DiCaprio se mostrando, a cada trabalho, um ator bastante competente, nos mostra uma atuação convincente e segura principalmente nos momentos dramáticos. Entre seus parceiros, destaco Joseph Gordon Levitt e confesso ter me decepcionado com Ellen Page (excelente em Juno e no tenso MeninaMá.com), apresentada apenas como a novata que serve como ponto de referência para o espectador. Os conceitos mais intricados da trama são quase sempre explicados para a sua personagem.

Extremamente bem dirigido, em tempo de ficções repletas de efeitos especiais e pouco conteúdo, A Origem é uma bela surpresa que faz pensar, dando margem a interpretações e elucubrações a la Lost. É uma pena que alguns detalhes (ainda que pequenos) me impeçam de dar uma nota maior, mas, pelas idéias geniais e inovadoras e o final elegante e bastante coerente que respeita a inteligência e liberdade do espectador, Nolan merece aplausos.

Leigômetro ★★★★☆ 

  • Título original: Inception, EUA
  • Ano: 2010
  • Direção: CHRISTOPHER NOLAN
  • Elenco: LEONARDO DICAPRIO, JOSEPH GORDON-LEVITT, ELLEN PAGE, TOM HARDY, KEN WATANABE, DILEEP RAO, CILLIAN MURPHY, TOM BERENGER, MARION COTILLARD, PETE POSTLETHWAITE, MICHAEL CAINE, LUKAS HAAS
  • Site oficial: INCEPTION (em inglês)
  • imdb: http://www.imdb.com/title/tt1375666/

Comentários

4 respostas para “A Origem: uma idéia quase perfeita”

  1. Bem, eu diria que Inception merece um 5, entrando para meu Top 4 filmes prediletos.

    E eu, particularmente, vejo alguns pontos que você cita como as imperfeições, eu já julgo como pontos importantes para o filme.
    A pouca valorização da realidade como um ponto de questionamento “mas será mesmo este momento a realidade?”.
    Assim como acredito que a participação de Ellen Page foi substancial, afinal, ela é o elo do espectador com o filme em si. Ela seria um tipo de “Tutorial” para nos ajudar a tentar entender ao filme.

    No mais, finalizamos em igual, “Nolan merece aplausos.”.

  2. Ramon Querubim

    Quase? Quando ouvi falar desse filme, eu pensei: Matrix de novo? E acabei não asstindo, olha só: preciso parar de ouvir e passar a ver por mim mesmo, ao invés de “quase” assistir…

  3. Bruno Zé

    Isso Ramon. Assista. O filme é muito bom. Depois volte aqui e deixe suas impressões.

  4. Bruno Zé

    Lucas, realmente é complicado essa questão de dar nota. Eu mesmo gostaria de dar um 4,5, mas como não há essa nota, era 4 ou 5. E, conforme pontuei, o filme apresenta alguns problemas que não me permitiram dar uma nota maior.

    Acabei de rever o filme e reforço a fraca atuação de Ellen Page. Conforme você disse, ela serve como uma espécie de tutorial para o espectador. Ocorreu que nessa revisita ao filme, isso se mostrou de um didatismo exagerado. Apenas acentuou essa minha impressão: ela serve apenas para “explicar” (entre aspas mesmo) o filme ao espectador. Ela é necessária, mas deveria ter um outro papel além desse. Talvez dividir as dúvidas de sua Ariadne com outros personagens amenizasse um pouco esse problema. Isso sem falar da sua expressão impassível.

    Importante anotar que dois problemas apontados no texto foram resolvidos numa segunda visita:
    1 – a cena do elevador, que realmente tem explicação e

    2 – a solução do problema, que é justificada de maneira orgânica e com um conteúdo dramático belíssimo


    Eu não tinha entendido como Cob convencia Saito a deixar o “limbo”. Por isso disse que a cena terminava de forma abrupta

    O problema talvez tenha sido a edição nervosa (o que reforça um aspecto negativo citado no texto) que atrapalha um pouco numa primeira visita ao longa.

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